Sérgio Petecão denuncia caos no setor. No Acre, mais de 4 mil famílias já abandonaram os seringais.

BRASÍLIA — O extrativismo na Amazônia está à beira da falência e a culpa é do próprio governo federal. A denúncia foi feita hoje pelo deputado Sérgio Petecão (PMN-AC) ao ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Mangabeira Unger, durante reunião do ministro com deputados e senadores da região. No Acre, por exemplo, mais de 4 mil famílias — algo em torno de 12 mil pessoas — abandonaram os seringais por falta de incentivos. Petecão também abordou a questão na reunião da bancada do Acre com os prefeitos acreanos que estão em Brasília.

Segundo Petecão, o caos se instalou porque a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) não coloca em prática a Portaria 1.039, de 28 de outubro de 2008. A norma concede subsídio de R$ 3,50 por quilo de borracha produzida em seringais da Amazônia. Petecão cobrou da Conab, por ofício, a aplicação imediata a portaria, mas até agora não obteve resposta.

Pela portaria, o subsídio mínimo de R$ 3,50 beneficiaria extrativistas, suas associações, cooperativas e indústrias de processamento de borracha, e passaria a valer para a safra colhida no período de 1º de julho de 2008 até 30 de junho deste ano. Mas, segundo Petecão, isso não vem ocorrendo, e por causa no atraso na aplicação da portaria a produção de borracha caiu em todos os estados da Amazônia.

Muito discurso e pouca ação
Para exemplificar o caos no setor, o deputado citou a cidade de Sena Madureira (AC) — a 145 km da capital, Rio Branco. Explicou que há 10 dias a principal usina de beneficiamento de borracha do município não recebe a matéria-prima. Petecão atribui a queda na produção a não-aplicação do subsídio.

“Por essa razão, chega a ser risível falar em investimentos, projetos faraônicos para a Amazônia, se o próprio governo é incapaz de fazer valer uma simples portaria”, critica Sérgio Petecão. Na opinião de Petecão, o governo faz muito discurso bonito, mas tem pouca ação para resolver o problema.

A denúncia de Sérgio Petecão pelo seu colega deputado por Rondônia, Ernandes Amorim (PTB). Para ele, o que ocorre na Amazônia com relação à comercialização da borracha é uma brincadeira. Disse que em seu Estado, Rondônia, “dezenas de famílias estão deixando de cortar seringa porque não há incentivo”. A mesma situação estaria ocorrendo também no Acre, Amazonas, Pará e Amapá.

“Enquanto o extrativista fica sem apoio, o governo está aí oferecendo ajuda bilionárias a bancos falidos, às montadoras e a outros segmentos”, ressalta Amorim. Para o deputado, é chegada a hora de o governo voltar sua atenção para o problema, “pois, do contrário, muito em breve as periferias das cidades estão apinhadas de seringueiros”.

Edivaldo Fortes, gerente da principal usina de borracha de Sena Madureira, no Acre, diz que a cidade já vivencia essa situação. De acordo com ele, mais de 4 mil famílias largaram a extração do látex da seringueira para morar nos centros urbanos. “Aqui, o setor extrativista parou”, lamenta-se. A empresa que dirige é a triste constatação dessa realidade.

“Há dez dias a minha empresa não recebe um quilo de borracha”, conta. No auge da produção, a usina beneficiava em média 200 toneladas/mês — esse total inclui borracha comprada no Amazonas e Rondônia.

O empresário também reconhece quem nem mesmo com o subsídio de R$ 3,50 por quilo ainda não é vantajoso para o extrativista riscar (cortar) seringa. Hoje, o seringueiro não quer se sujeitar a receber os R$ 1,20 pagos atualmente pelo quilo da borracha. “Ele (o seringueiro) prefere cortar madeira, criar boi, ou mesmo ir para a cidade trabalhar como diarista”. O valor chegou aos patamares de 2003, segundo a Associação Paulista de Produtores e Beneficiadores de Borracha.

Na cidade, uma diária de pedreiro não sai por menos de R$ 20. Trabalhando os 12 meses do ano, um seringueiro não chegar a produzir mil quilos de borracha. Ou seja, ele fecharia o ano com uma renda inferior a R$ 1,2 mil — um ganho menor que R$ 100 por mês.

“Como é que vamos segurar o homem na floresta, com uma situação dessas?”, indaga o empresário. Edivaldo Fortes lembra, ainda, que a situação também é caótica em relação à colheita de castanha-do-Brasil. No ano passado, a lata (com 18 hectolitros) custava R$ 12. Hoje, o preço caiu pela metade.

Salto na produção nacional
De 1997 a 2002, a produção da borracha natural no Brasil saltou de 50 mil para 90 mil toneladas/ano, estimulada pela subvenção na qual o Governo Federal compensa o beneficiário do produto. O subsídio cobre a diferença entre os preços do mercado interno e o valor do produto importado somado aos custos de internalização que incluem frete marítimo, frete terrestre e seguros.

Até a década de 1960 a Amazônia era responsável pela quase totalidade da borracha consumida no Brasil. Mas, hoje, a realidade mudou. É São Paulo quem lidera de longe a produção brasileira de borracha. Os seringais paulistas já respondem por 60% de toda a produção nacional, que deverá atingir neste ano a casa de 108 mil toneladas.

Fruto de aprimoramentos genéticos, os seringais paulistas foram desenvolvidos na década de 30 no noroeste do Estado, sobretudo no pólo formado por São Jose do Rio Preto e Barretos. O plantio comercial começou apenas nos anos 80. Ao contrário da seringueira do Norte do país, vítima do calor e da umidade da Amazônia, as árvores paulistas respondem melhor ao clima paulista. Não são acometidas, por exemplo, pelo “mal das folhas”, praga que atacou centenas de árvores no Norte no passado. Prova disso é a extensão de área plantada em São Paulo, de 36,1 mil hectares, e no Acre, de 1,3 mil.

No total, o país tem cerca de 200 mil hectares com seringueiras plantadas, sendo que 130 mil já estão produzindo. A rentabilidade da borracha é de US$ 1.500 por hectare/ano; da cana, US$ 1 mil.

Twitter Delicious Facebook Digg Stumbleupon Favorites More

 
Clarim da Amazônia