Para vencer, político aceita “engolir o vômito do adversário”

DANIEL OLIVEIRA DA PAIXÃO - A campanha política deste ano, principalmente em nível federal, chega a ser nojenta. Tanto o PT quanto o PSDB apelaram para o golpe baixo, insensato, sem coerência. Hoje está provado para todos os brasileiros que eles querem apenas o poder, mesmo que seja necessário engolir o vômito do inimigo. Uso essa figura de linguagem forte assim para vocês verem a que ponto chegou a nossa política. Em Goiás, por exemplo, Iris Rezende deu várias entrevistas (devidamente registradas em vídeo), dizendo que jamais apoiaria o Lula e o PT e elenca uma série de motivos para tal. Agora Lula aparece em seus comícios pedindo votos para o mesmo. No caso do Iris Rezende o provérbio bíblico é bem apropriado: “O cão voltou ao próprio vômito”. No Ceará, uma das figuras do PSB nacional, (Ciro Gomes) demonizou o PMDB e derramou elogios ao Serra, citando que ele é mais bem preparado do que a Dilma para governar o Brasil e agora é indicado coordenador da campanha do PT no segundo turno.

Eu sinto-me à vontade para dizer aos meus leitores que condeno de forma veemente essa desfaçatez, pois sou um socialista convicto, e por achar a Dilma com um projeto de governo melhor do que o de Serra votarei nela neste segundo turno (no primeiro turno votei na Marina Silva). O fato de votar em Dilma não me obriga abrir mão de meus ideais e convicções e aceitar tudo, goela abaixo. Não concordo com a baixaria que está acontecendo no país (desencadeada principalmente pelo staff de campanha do Serra, isso é verdade), mas também condeno o contra-ataque do PT na mesma moeda. A história de que chumbo trocado não dói não é verdade. Numa guerra, mesmo o hipotético vencedor, descobre que as feridas abertas e as implicações morais são tantas que a vitória tem sabor de derrota. Um exemplo claro disso é a guerra do Paraguai, um fardo que vamos levar conosco pelo resto de nossas vidas.

Silas Malafaia
Apesar de achar as pregações de Silas Malafaia um tanto rancorosas, de certa forma eu via algumas virtudes nesse pregador e passei a admirá-lo, com as devidas ressalvas. Mas o seu envolvimento vergonhoso em campanha presidencial, neste ano, me obriga a rebaixá-lo conceitualmente. O pastor Silas Malafaia revelou-se para o Brasil em um oportunista, interessado apenas em crescer exponencialmente, custe o que custar, e expõe o seu “rebanho” ao ridículo. Para ele, lamento dizer, mas o provérbio bíblico que citei acima é bem apropriado. O cão voltou ao próprio vômito. Não pensem que o absolveria em caso dele apoiar a Dilma porque vou votar nela. Aqui em Rondônia eu voto em Cahulla e apesar disso condeno os pastores que eventualmente estejam engajados em sua campanha. Quem acompanha Papudiskina desde que comecei a escrever essa coluna, em 1991, sabe que eu nunca apoiei pastores em campanha.

Vi alguns vídeos de Malafaia, na Internet, onde ele usa palavras inapropriadas para um pastor cristão. Embora Jesus tenha se indignado e dito palavras duras algumas vezes (para mostrar sua indignação com os vendilhões do templo e os fariseus hipócritas), de um modo geral ele se dirigia ao povo com palavras de mansidão, amor supremo e misericórdia. Não é isso o que vejo em alguns pastores, especialmente Silas Malafaia. Tive acesso a um vídeo onde ele, ao tomar conhecimento de uma notícia de alguém que o criticava, passou a berrar no microfone e a dizer palavras completamente insanas, principalmente provenientes de um pastor. Definitivamente perdi todo o resto de admiração que tinha por ele.

No caso desse apoio dele a Marina e uma semana depois deixar de apoia-la, simplesmente por ela pedir um plebiscito para discutir temas controversos como o aborto, mostrou o quão volúvel e oportunista ele é. De uma hora para outra, “aparentemente” sem justificativa, passou a apoiar o José Serra, ainda no primeiro turno. Nesta semana Folha de São Paulo explicou o motivo para essa mudança do renomado pastor: Serra prometeu benefícios às igrejas evangélicas e implicitamente cabe aí a ideia de maior facilidade para a concessão de um canal de TV para as entidades religiosas.

Malafaia, contudo, é muito esperto. Abusando da fé das pessoas cristãs, tratou logo de justificar-se aparentemente com sólidos argumentos. De fato, embora negue agora, Dilma, no seu íntimo é a favor da descriminalização do aborto. Até eleitores dela, como é o meu caso, sabemos disso. Mas o que Malafaia nega aos seus milhões de admiradores é que José Serra também é pessoalmente favorável à descriminalização do aborto e deixou isso bem claro quando foi Ministro da Saúde no governo de FHC. Logo, se fosse para votar com base em críticas que fazemos a certas leis civis em análise no parlamento, nós, que somos cristãos, teríamos de votar em branco ou nulo, sempre. Eu, contudo, avalio que as leis civis devem ser debatidas pelos cidadãos, mas fora do âmbito religioso.

Leis Civis x Leis Eclesiásticas
A vida na terra sempre foi uma competição monstruosa, onde os mais fortes impõem-se e isso também vale para os seres humanos, apesar do nosso conceito de que somos animais superiores. Logo que o homem deixou a caverna e passou a viver em sociedade (associar-se com seus pares), surgiu logo a necessidade de leis de organização social, com direitos e deveres (mais deveres do que direitos). Óbvio que em sociedade, houve a necessidade da figura de governantes e estes não demoraram muito a beneficiar-se de seus cargos. Mas para governar, esses líderes descobriram que, além da força bruta, seria necessário persuadir os governados de modo a evitar rebeliões. Afinal de conta, o que seria da minoria que governa se os governados, em maior número, resolvessem questioná-los?. Foi nesse tempo que descobriram que a religião, como elemento de coesão de um povo, poderia ser um bom instrumento. Os políticos criaram então a fórmula ideal: fusão de leis civis às leis eclesiásticas. Isso garantiu poderio e força a praticamente todos os grandes impérios do passado. A religião se tornou tão absurdamente opressora que, com o passar do tempo, algumas nações mais desenvolvidas perceberam a necessidade de dissociá-la do Estado e torna-la um poder paralelo, mas sem muitas implicações civis. Hoje, no Brasil, em pleno século XXI, percebemos que o cordão umbilical ainda não foi totalmente cortado. Ainda se usa, descaradamente, a religião como força de coesão para governar um povo. Mais do que nunca devemos entender que está na hora de compreendermos que leis civis jamais devem se espelhar em leis eclesiásticas. Só haveria sentido para a fusão das leis civis com leis eclesiásticas se tivéssemos no país uma religião única. Não sendo assim, só posso imaginar que os políticos no Brasil abrem um precedente perigoso ao dar a falsa impressão de que, se eleitos, vão fundir leis eclesiásticas às leis religiosas. Claro que isso é impossível. A mesma bíblia é interpretada diferentemente por cada denominação evangélica e inclusive dentro de uma mesma denominação. Vejamos o caso da maior e mais poderosa igreja evangélica do Brasil, a Assembleia de Deus. Nos subúrbios e pequenas cidades o jeito de se vestir e agir de seus membros é completamente diferente da forma como agem os seus irmãos cujos templos estejam em grandes cidades.

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Clarim da Amazônia